Metodologia de investigação pericial de incêndio veicular proposta pelo Corpo de Bombeiros de Santa Catarina

Resumo do artigo elaborados por Cap. Willian Leal Nunes, Capitão do Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catariana e Ten. Vanderlei Vanderlino Vidal, Tenente Coronel do Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina

Metodologia sugerida pela Companhia CBSC

Com intuito de aplicar metodologia específica, sistemática e lógica, já amplamente utilizada por outros órgãos especializados em incêndio, a perícia decidiu aplicar as metodologias sugeridas pelo PROCEDIMENTOS PARA INVESTIGAÇÃO DE INCÊNDIOS EM VEÍCULOS, elaborados por Cap. Willian Leal Nunes, Capitão do Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catariana e Ten. Vanderlei Vanderlino Vidal, Tenente Coronel do Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina, já devidamente referenciado.

Introdução

Este estudo aborda o desenvolvimento da perícia de incêndios em veículos no Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina, com foco na criação de protocolos para coleta de dados que orientem os Peritos. O texto destaca a importância de distinguir incêndios em veículos de outros tipos, como em edificações ou vegetação, mas não se aprofunda em sistemas específicos de veículos. A metodologia da pesquisa é indutiva e qualitativa, baseada em pesquisa bibliográfica, documentação e entrevistas com Peritos. O artigo propõe uma sequência genérica de procedimentos para a perícia de incêndios em veículos, enfatizando a necessidade de adaptação para cada caso específico, e sugere o uso de uma lista de verificação para garantir uma investigação mais precisa e científica.

A elaboração deste ensaio utilizou etapas de pesquisa, classificadas por Saunders, Lewis e Thornhill (2003), como indutivo, quanto à lógica de pesquisa, uma vez que se valeu da experimentação para a elaboração de conclusões gerais; a abordagem do problema será qualitativa, uma vez que não se busca obter estatísticas, mas a elaboração de um procedimental aplicado à área.

(NUNES e VIDAL, 2017)

Das generalidades

O estudo destacada as particularidades dos incêndios em veículos em comparação com incêndios em edificações e vegetação. A complexidade dos sistemas veiculares, incluindo tecnologia avançada e materiais leves, influencia o desenvolvimento dos incêndios em veículos, que tendem a se propagar rapidamente devido à ventilação abundante.

A diagnose de incêndio e explosões em veículos constitui-se em uma modalidade particular do campo da engenharia forense relativo à perícia de incêndios, dadas as peculiaridades inerentes aos veículos automotores, as quais demandam um know-how diferenciado quanto aos princípios de funcionamento dos diversos sistemas veiculares com potencial para a deflagração de um incêndio, e o respectivo diagnóstico de falhas, além da considerável gama de incêndios intencionais, visando, inclusive a fraude contra companhias seguradoras.

(KLEINUBING e ARAGÃO, 2014)

A compartimentação dos veículos pode acelerar a pirólise dentro do compartimento, mas também pode criar barreiras para a propagação das chamas. Além disso, veículos possuem muitos condutores elétricos e fluídricos, cuja natureza e combustibilidade variam.

Os tanques de combustível, embora contenham vapores inflamáveis, são menos propensos a explosões devido à riqueza da mistura interna e dispositivos de alívio de pressão. No entanto, o Perito deve considerar essas variáveis ao analisar os efeitos do fogo em um veículo.

A intensidade do fogo não necessariamente indica o uso de acelerantes, devido aos materiais combustíveis presentes nos veículos modernos. De acordo com o entendimento de Kleinubing e Aragão (2014, p.340), geralmente ocorre “devido ao tipo e à quantidade de materiais combustíveis existentes atualmente nos veículos automotores

A análise da susceptibilidade à deflagração de incêndios em veículos requer avaliação de vários fatores, incluindo o tipo de veículo, uso, idade, conservação e materiais presentes.

Quando da análise de um veículo incendiado, deve-se avaliar a sua susceptibilidade à deflagração de incêndios, a partir do tipo de veículo, da sua utilização, do seu tempo de uso, do seu estado de conservação, e ainda, dos materiais de construção do veículo e daqueles transportados pelo mesmo

(KLEINUBING e ARAGÃO, 2014)

Das coletas de dados

Nesta seção, são delineados os procedimentos sugeridos para a coleta de dados durante a perícia de incêndios em veículos. O método de pesquisa de campo segue princípios periciais, proposto por MONTESANI (2006) como MÉTODO REVERSO, começando pelo ponto menos afetado até o mais afetado, de fora para dentro e do geral para o específico. O artigo propõe um procedimento de campo que orienta o Perito na coleta de dados e na elaboração do laudo pericial de incêndio em veículos.

Esta metodologia objetiva permitir a realização de uma perícia criteriosa por meio da definição de etapas e procedimentos a serem averiguados no veículo afetado pelo incêndio, utilizando o que será denominado aqui como sendo o MÉTODO REVERSO. A metodologia proposta determina que a avaliação do veículo comece pelos pontos não afetados pelo incêndio e pela classificação de Zonas de Combustão definindo pontos prioritários para análise. Deste modo possibilita avaliar os sistemas energéticos que poderiam ter contribuído para a ocorrência do primeiro foco de incêndio e chegar até mesmo à sua causa.

(MONTESANI, 2006)

Os itens sugeridos visam a orientar a investigação de incêndios em veículos de maneira geral, sem suprimir dados relevantes. É ressaltado que a perícia deve levar em consideração o tipo específico de veículo e suas particularidades, o que não é detalhado neste estudo. A norma NFPA 921 é aplicada como uma fonte de consulta útil e importante neste estudo.

É enfatizado que a ordem dos itens sugeridos pode ser ajustada de acordo com as circunstâncias da perícia. Por exemplo, em incêndios controlados em seu início, a determinação da ZONA DE ORIGEM pode não requerer comparação entre compartimentos. Além disso, a coleta de depoimentos pode ser realizada antes, durante ou após os exames no veículo, dependendo da avaliação do perito no momento da perícia. Em resumo, a sequência de procedimentos visa orientar o perito a abordar todas as circunstâncias envolvidas e compreender a dinâmica do incêndio, sem deixar de considerar qualquer vestígio ou indício relevante.

Da segurança no local

O estudo trata da importância da segurança do local como a primeira prioridade ao realizar uma perícia em veículos incendiados, de acordo com as diretrizes da NFPA 921 (2011). Seguem os principais pontos destacados:

Segurança do Local: Ao chegar para realizar a perícia em um veículo incendiado, a primeira providência é garantir a segurança do local. Isso é crucial para proteger a integridade do Perito e seus Assistentes.

Foco no Veículo: O Perito deve estar concentrado na perícia do veículo e não pode se distrair com preocupações de segurança externa, portanto é imprescindível a mobilização de profissionais especializados em segurança para garantir os serviços periciais.

Locais Remotos: Veículos incendiados muitas vezes são encontrados em locais ermos, como estradas secundárias de pouco movimento, o que pode dificultar o acesso, porém facilita o isolamento e a segurança.

Auxiliares e Policiamento: Recomenda-se que o Perito conte com auxiliares e/ou policiamento ostensivo para garantir o isolamento da área da perícia. O Perito é responsável por providenciar os meios necessários para sua própria segurança.

Segurança do Veículo: Além da segurança pessoal, é igualmente fundamental avaliar a segurança e estabilidade do veículo incendiado. Isso implica gerenciar possíveis riscos, como a possibilidade de movimentação do veículo, vazamento de fluidos e combustíveis, risco de centelhamento e ameaças de descargas elétricas, conforme a situação específica exija.

Em resumo, a segurança do local é um passo crucial ao realizar uma perícia em veículos incendiados, visando proteger a integridade do perito e garantir um ambiente seguro para a investigação.

Fotografias

O estudo trata da importância da importância da fotografia na perícia de veículos incendiados. Seguem os principais pontos destacados:

Fotografia do Local: O Perito deve fotografar tanto o local onde o veículo foi encontrado para a perícia quanto o local onde o veículo foi incendiado, caso tenha sido removido. Não há um limite mínimo ou máximo para o número de fotografias.

Abrangência das Fotografias: Todas as superfícies do veículo devem ser fotografadas, incluindo teto e assoalho, áreas queimadas e não queimadas, exteriores e interiores.

Itens Específicos a Serem Fotografados: Além das superfícies, devem ser registradas fotografias externas de todas as áreas do veículo (frente, laterais e traseira), um elemento de identificação (VIN ou placa), os três compartimentos, a zona de origem do incêndio, o foco inicial e agente ígneo.

OBS: VIN significa “Vehicle Identification Number” e no Brasil é conhecido como número do chassi.

Relevância das Fotografias: A relevância das fotografias deve ser considerada; por exemplo, se o Perito já conseguiu comprovar a hipótese de surgimento e propagação do fogo com outras fotos, imagens do teto e/ou do assoalho podem não ser necessárias.

Qualidade das Fotografias: Recomenda-se a captura de imagens em alta resolução que possam ser ampliadas, se necessário, para esclarecer dúvidas durante a elaboração do laudo pericial.

Registro de Mudanças: É importante que as fotografias sejam tiradas em todas as etapas da investigação, e qualquer objeto só pode ser removido ou alterado após o registro de sua posição original.

Em resumo, a fotografia desempenha um papel fundamental na perícia de veículos incendiados, permitindo documentar o estado do veículo, a cena do incêndio e outros detalhes relevantes para a investigação, fornecendo uma base visual sólida para a elaboração do laudo pericial.

Vistoria e exame das áreas adjacentes

O estudo trata da importância de realizar exames na área adjacente ao veículo incendiado durante a investigação pericial. Seguem os principais pontos destacados:

Análise do Ambiente: O Perito deve se aproximar do veículo incendiado e observar o ambiente em que ele está posicionado. Isso ajuda a determinar se o incêndio teve origem no veículo e se espalhou para o entorno ou se o incêndio começou fora do veículo e o atingiu posteriormente.

Marcas da Combustão: É crucial observar as marcas de combustão no ambiente e analisar a direção em que as chamas se propagaram.

Material Disperso: A análise da área adjacente ao veículo pode revelar materiais dispersos. Por exemplo, a presença de objetos como galões ou garrafas podem ser significativas para a investigação.

Outras Evidências: O Perito também deve prestar atenção a marcas de pneu, pegadas e outros materiais, sejam eles do veículo em questão ou não, que estejam próximos ao veículo incendiado.

Recipientes de Líquidos Inflamáveis: Galões ou garrafas com odor de combustível merecem atenção especial. Eles devem ser fotografados, avaliados e, se necessário, coletados, pois podem estar relacionados à origem do incêndio, conforme bem apresenta DEHAAN; ICOVE, 2012, p.351-353.

Evidências de Incêndio Criminoso: A presença de pistas evidentes como recipientes de líquidos inflamáveis e um segundo jogo de marcas de pneu nas proximidades, pode indicar a possibilidade de um incêndio criminoso. O manual de Combate a Incêndio do Corpo de Bombeiros de São Paulo (MTB 19) enfatiza esta questão.

Pessoas que atearam fogo aos próprios carros, normalmente têm a intenção de fraudar uma companhia de seguros, fazem assim em locais afastados e deixam muitas pistas ao crime. Por exemplo, eles deixarão recipientes de líquidos inflamáveis por perto e retiram do veículo objetos valiosos e peças de fácil comércio. Eles também precisam de transporte para casa depois que o fogo é ateado, assim há frequentemente um cúmplice que dirige um segundo carro, que deixará um segundo jogo de marcas de pneu nas adjacências. Ao procurar evidência de incêndio premeditado atente para um segundo jogo de rastros de pneu, para pegadas, e para recipientes de líquidos inflamáveis na área

(CORPO DE BOMBEIROS MILITAR DE SÃO PAULO, 2006, p. 66).

Local Diverso: Se o veículo incendiado foi removido para um local diferente, o Perito deve inspecionar o novo local, especialmente se houver pouca movimentação, a fim de coletar dados relevantes para a investigação.

Em resumo, examinar a área adjacente ao veículo incendiado é uma parte essencial da investigação pericial, pois pode fornecer pistas valiosas sobre a origem e as circunstâncias do incêndio. Isso inclui a observação de marcas de combustão, materiais dispersos, evidências de incêndio criminoso e outros detalhes que podem ajudar na elaboração do laudo pericial.

Marcas externas

O estudo trata da importância de examinar as marcas de combustão exteriores no veículo durante uma perícia em casos de incêndio. Seguem os principais pontos destacados:

Observação de Marcas de Combustão: O Perito deve examinar as marcas de combustão no exterior do veículo para identificar padrões que possam esclarecer a direção da propagação das chamas.

Materiais Combustíveis: Incêndios em veículos costumam deixar um rastro de materiais queimados ao redor do veículo, como borrachas e polímeros que se desprendem ou derretem devido ao calor, conforme enfatiza DEHAAN; ICOVE, 2012, p.353.

Seccionamento em Quadrantes: O uso do seccionamento virtual do veículo em quadrantes pode auxiliar na identificação da área mais afetada pelo incêndio. Isso envolve traçar linhas verticais e horizontais no plano médio do veículo, dividindo-o em partes para análise.

Figura 1 – Trata-se da Figura 2 do procedimento em questão.

Bocal do Reservatório de Combustível: O bocal do reservatório de combustível é uma área importante a ser observada. O derretimento dessa peça pode permitir a vaporização do combustível no tanque, causando marcas de combustão intensa acima de sua posição original.

Tal situação não é indicativo de incêndio intencional, originado neste ponto, mas deve ser observado com cautela, pois a presença de restos de tecido nesta região, pode indicar que um pavio improvisado foi utilizado para originar o fogo.

(NUNES e VIDAL, 2017)

Acessos e Arrombamento: É essencial observar e registrar se as portas, capô e outros acessos estavam abertos ou fechados e se havia sinais de arrombamento, especialmente se os bombeiros tiverem realizado aberturas forçadas durante o combate ao incêndio.

Estado dos Pneus: Os pneus podem fornecer informações relevantes. Mesmo sob o efeito de um incêndio intenso, os pneus podem permanecer na porção entre a roda e o solo. O Perito deve verificar se os pneus foram substituídos por pneus velhos ou desgastados, o que pode indicar preparação prévia para o incêndio (DEHAAN; ICOVE, 2012, p.353).

Para-brisas: O comportamento do para-brisas pode ser relevante para a investigação. De acordo com o itens 25.8.1.1 e 25.8.1.2 da NFPA 921 (versão 2011), e DeHaan e Icove (2012, p.354), danos na parte superior do para-brisa geralmente indicam incêndios originados no habitáculo, enquanto danos na parte inferior, especialmente do lado do passageiro, indicam incêndios originados no compartimento frontal do veículo, onde o motor está localizado.

6 A NFPA 921, versão 2011, no item 25.8.1 afirma que a maioria dos veículos pode ser divididos nestes três compartimentos: motor, carga e habitáculo/interior.

(NUNES e VIDAL, 2017)

Esses detalhes e análises das marcas de combustão exteriores no veículo são fundamentais para o perito na busca de pistas que possam esclarecer a origem e as circunstâncias do incêndio, auxiliando na elaboração do laudo pericial.

Marcas internas

O estudo trata da importância de observar as marcas de combustão no interior do veículo durante uma perícia em casos de incêndio. Segue os principais pontos destacados:

Compartimentos Interiores: O Perito deve observar as marcas nos compartimentos interiores do veículo, incluindo o compartimento do motor, habitáculo (onde os ocupantes estão) e o compartimento de carga. A observação deve começar no compartimento menos afetado e prosseguir em direção ao mais afetado, iniciando pela parte superior e indo em direção à inferior.

Análise de Dutos e Condutos: Durante essa etapa, o Perito deve examinar a condição de dutos e condutos de fluidos, como sistemas hidráulicos, freios, arrefecimento, transmissão, diferencial e outros relevantes para o veículo. Além disso, é importante avaliar a condição de rolamentos, eixos e outras estruturas sujeitas ao atrito, que podem gerar calor.

Atenção Proporcional: As estruturas sujeitas a atrito devem receber atenção proporcional à intensidade do fogo no local onde estão localizadas. Isso significa que o Perito deve considerar o nível de dano causado pelo fogo ao analisar essas estruturas.

Efeito do Calor: Testes citados por DeHaan e Icove (2012, p.356), revelaram que a temperatura pode atingir mais de 1.000 ºC na linha próxima ao teto do veículo, o que é suficiente para fundir vidros e esquadrias de metal próximas. Isso destaca a importância de entender o efeito do calor gerado pelo incêndio.

Identificação de Materiais: O Perito deve identificar quais materiais combustíveis e não combustíveis estavam presentes antes do incêndio e quais permaneceram após a extinção das chamas. Essa análise ajuda a determinar a natureza dos materiais e como eles foram afetados pelo fogo.

A análise das marcas de combustão no interior do veículo é crucial para entender a extensão do dano causado pelo incêndio e identificar pistas que possam esclarecer sua origem e causas. Isso inclui a consideração de materiais presentes, sistemas mecânicos e de fluidos, bem como a avaliação do impacto do calor no interior do veículo.

O Perito pode se valer dos itens para identificar os materiais

Zona de origem

O estudo trata da investigação pericial relacionada à definição da Zona de Origem do incêndio em um veículo. Seguem os principais pontos destacados:

Observação de Padrões de Queima e Marcas de Combustão: O Perito deve observar os padrões de queima e as marcas de combustão tanto no exterior quanto no interior do veículo.

Estudo de Vestígios: O estudo dos vestígios encontrados no veículo, tanto dentro quanto fora, é fundamental para determinar o sentido de propagação das chamas.

Definição da Zona de Origem: Com base na análise das informações anteriores, o Perito pode determinar ou confirmar o sentido em que as chamas se propagaram e, assim, definir a Zona de Origem do incêndio.

Utilização de Características Construtivas do Veículo: O Perito deve utilizar as características construtivas específicas do veículo em questão para identificar a Zona de Origem. Além disso, é importante usar termos adequados ao tipo de veículo para que tanto especialistas quanto pessoas não familiarizadas com o assunto possam entender claramente a análise.

A definição da Zona de Origem do incêndio é um passo crucial na investigação, pois ajuda a determinar onde o fogo começou e fornece insights valiosos sobre as possíveis causas do incêndio. Isso envolve uma análise minuciosa das evidências e a aplicação de conhecimentos específicos sobre a estrutura e os componentes do veículo.

Comparativa com veículo similar

O estudo trata da importância de realizar uma comparação entre o veículo periciado e outro similar, de mesmo fabricante, modelo e ano, ainda conservado, como parte da investigação pericial em casos de incêndio em veículos. Seguem os principais pontos destacados:

Utilização de Veículo Similar: Tanto a NFPA 921 (versão 2011) quanto a doutrina sobre perícia de incêndio em veículos recomendam a comparação do veículo periciado com outro similar que seja do mesmo fabricante, modelo e ano, e que ainda esteja em boas condições de conservação. PAUTAR O PEDIDO DO PERITO DE VEÍCULOS PARADIGMAS.

Recorrer a Manuais ou Prospectos do Fabricante: Na ausência de um veículo similar disponível, o Perito pode recorrer a manuais ou prospectos elaborados pelo fabricante. Esses documentos podem conter informações detalhadas sobre a construção e os componentes do veículo. PAUTAR O PEDIDO DO PERITO DE VEÍCULOS PARADIGMAS.

Padrão Construtivo Idêntico: A medida é particularmente útil para veículos comerciais tipo automóvel, uma vez que esses veículos geralmente seguem um padrão construtivo idêntico, com modificações insignificantes feitas pelos usuários, como pendurar desodorizantes ou colocar adesivos. Isso permite ao Perito reconstruir eficientemente a condição original do veículo antes do incêndio.

Relevância para Veículos Não Produzidos em Série ou Personalizados: Mesmo para veículos que não são produzidos em série ou que possuem alto grau de personalização, a comparação é igualmente eficaz. Descrições detalhadas dos componentes fornecidas por pessoas relacionadas ao veículo podem ajudar o Perito a reconstruir mentalmente o modelo correto, evitando hipóteses falsas e conclusões errôneas.

Em resumo, a comparação com um veículo similar ou o uso de manuais e prospectos do fabricante é uma prática valiosa na investigação pericial de incêndios em veículos, pois auxilia o perito na reconstrução precisa da condição original do veículo antes do incêndio, o que é essencial para determinar as causas e as circunstâncias do incêndio.

Integridade dos componentes

Após realizar a comparação do veículo com outro similar, o Perito deve proceder a uma minuciosa avaliação para determinar se todos os componentes originais estão presentes de forma integral ou parcial. Essa análise desempenha um papel crucial na investigação de incêndios em veículos, e tanto a NFPA 921 (versão 2011) quanto as diretrizes de DeHaan e Icove (2012) destacam a importância dessa etapa.

É uma prática comum que criminosos, ao perpetrarem incêndios criminosos em veículos, retirem peças de valor, como bancos, sistemas de som, rodas/pneus, estepe e outros componentes valiosos antes de incendiar o veículo. Além disso, eles podem optar por substituir peças essenciais por outras de menor valor comercial, tudo isso com a finalidade de dificultar a identificação da causa do incêndio e confundir o Perito.

Portanto, a ausência ou a presença parcial desses acessórios, independentemente de serem originais ou não, pode servir como uma pista relevante para o Perito durante a investigação de incêndio intencional. Uma análise cuidadosa da presença e da condição desses componentes pode contribuir significativamente para esclarecer as circunstâncias do incêndio e ajudar na identificação de qualquer atividade criminosa ou tentativa de fraude envolvida.

Coleta de depoimentos

A coleta de depoimentos de pessoas relacionadas ao evento é uma etapa crucial na investigação de incêndios em veículos. Esses depoimentos podem ser obtidos em um momento anterior à perícia, sem prejuízo para a investigação, e desempenham um papel fundamental para o perito ao elucidar pontos obscuros e direcionar a investigação de maneira adequada.

A doutrina de perícia em incêndio veicular destaca que diversos fatores podem motivar pessoas a provocar incêndios em veículos de forma dolosa e, consequentemente, podem levar à omissão de informações importantes diante do perito. Isso pode incluir fraudes em seguradoras, locadoras de veículos, destruição de provas de outros crimes, entre outros motivos.

No entanto, a participação do usuário do veículo na investigação é relevante para esclarecer diversos aspectos que não podem ser determinados apenas por meio das evidências físicas. Por exemplo, o usuário pode fornecer informações sobre o odor de combustível no interior do veículo antes do incêndio ou qualquer problema mecânico que tenha notado.

A coleta de depoimentos deve incluir:

O condutor ou usuário do veículo: Questionar sobre as condições gerais de funcionamento do veículo, possíveis falhas durante o uso, registros de manutenção, histórico de problemas mecânicos, suscetibilidade a incêndios do modelo do veículo e informações sobre recalls promovidos pelo fabricante (KLEINÜBING; ARAGÃO, 2014, p.341-342).

A primeira pessoa a avistar o incêndio: Obter informações sobre as circunstâncias em que o incêndio foi observado, como sua localização, momento em que percebeu o fogo e outras informações relevantes (DEHAAN; ICOVE, 2012, p.362) .

Bombeiros que atuaram no controle das chamas (se aplicável): Coletar informações sobre as ações tomadas durante o combate ao incêndio, qualquer comportamento incomum do fogo, dificuldades encontradas e outros detalhes que possam ser relevantes para a perícia.

Outras pessoas com informações relevantes: Identificar e entrevistar outras testemunhas que possam oferecer informações importantes sobre o evento, como observações sobre o incêndio, comportamento do veículo ou qualquer atividade suspeita nas proximidades.

As perguntas a serem feitas a cada pessoa devem ser adaptadas às suas observações e experiências específicas relacionadas ao incidente. Esses depoimentos podem ser cruciais para a investigação, ajudando o perito a entender melhor as circunstâncias do incêndio e a tomar decisões informadas sobre as análises subsequentes, incluindo a reavaliação de evidências físicas, se necessário.

Sistemas de combustíveis e outros fluídos

A análise do sistema de combustível e fluidos em veículos é um passo essencial na investigação de incêndios, e várias considerações importantes são abordadas neste trecho:

Ordem de Exame: O Perito deve iniciar a análise do sistema de combustível e fluidos a partir do ponto menos danificado e progredir em direção ao ponto mais danificado. Isso ajuda a reconstruir a sequência dos eventos que levaram ao incêndio.

Bomba de Combustível: A bomba de combustível é destacada como um ponto sensível do sistema de combustível, e é comum que ocorram vazamentos em suas proximidades. Isso pode ser relevante para a investigação.

Atenção às Uniões e Mangueiras: O Perito deve prestar especial atenção às uniões entre mangueiras flexíveis e dutos rígidos, especialmente nas proximidades do motor. Além disso, mangueiras e filtros localizados próximos a fontes de calor, como o sistema de escape do motor, são destacados como áreas de interesse.

Temperaturas Elevadas do Sistema de Escape: É mencionado que o sistema de escape dos veículos pode atingir temperaturas elevadas, especialmente o coletor de descarga, o catalisador e o silenciador. Essas temperaturas podem ser suficientes para originar incêndios quando há vazamento de combustível líquido em contato com superfícies aquecidas.

Sendo assim, o vazamento de combustível líquido, em contato com superfícies aquecidas do veículo, pode deflagrar um incêndio.

[…]

Com relação ao sistema de escapamento, constituído pelo coletor de descarga, pelo catalizador (sic), pelo silenciador e pelo tubo de escape, a temperatura dos gases queimados que saem da câmara de combustão de um motor atingem uma temperatura entre 700 a 800ºC. A 8 Nestes pontos pode ocorrer vazamento devido má fixação, braçadeiras inadequadas, arestas (cantos vivos) e pela vibração do conjunto. Ignis: revista técnico científica do Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina, Florianópolis, v. 2, n. 1, maio./out. 2017. 185 temperatura do coletor de descarga e dos demais componentes, por sua vez, pode atingir até 500ºC, com temperatura de superfície exterior maior do que 300ºC, podendo ser ainda maior no caso de conter resíduos de combustível não queimado devido a funcionamento inadequado do sistema de alimentação.

(Kleinubing; Aragão, 2014, p.345)

Riscos por Resíduos de Combustível: O texto destaca que resíduos de combustível não queimado devido a um funcionamento inadequado do sistema de alimentação podem contribuir para o risco de incêndio devido ao calor gerado pelo sistema de escape.

Placas Metálicas de Isolamento: Para reduzir o risco de incêndio por aquecimento, placas metálicas são mencionadas como uma medida que isola o sistema de escape e a carroceria do veículo.

Pressão no Sistema de Combustível: DEHAAN; ICOVE, 2012, p.358 ressaltam que o sistema de combustível continua sob pressão mesmo quando o veículo está desligado. O ressecamento das mangueiras ao longo do tempo pode levar a vazamentos de combustível, uma vez que a pressão da injeção eletrônica varia entre 35 e 70 psi (NFPA 921, versão 2011, item 25.5.1.2).

Exame de Fluidos Hidráulicos: Além do sistema de combustível, o texto menciona que os fluidos hidráulicos, comuns em veículos e máquinas pesadas, também devem ser examinados da mesma forma que as linhas de combustível.

Em resumo, a análise detalhada do sistema de combustível e fluidos é fundamental para determinar se vazamentos ou outras anomalias nesse sistema podem ter contribuído para o incêndio. Isso envolve considerar as temperaturas elevadas do sistema de escape, resíduos de combustível não queimado e a pressão no sistema de combustível como fatores de risco potenciais.

Análise do sistema elétrico

A análise do sistema elétrico de um veículo em investigações de incêndio é uma etapa fundamental, e deve ser conduzida do ponto de carga para a fonte de energia. O perito deve avaliar a integridade dos condutores metálicos, incluindo o estado do isolamento, caso ainda esteja presente. Seguem alguns pontos importantes a serem seguidos:

Análise reversa: A análise do sistema elétrico em veículos deve começar da carga para a fonte, verificando a integridade dos condutores metálicos e, se presente, o isolamento.

Fenômenos termoelétricos: em veículos são semelhantes aos que ocorrem em edificações e podem levar a incêndios.

Originalidade dos acessórios: A investigação deve dar destaque aos acessórios não originais instalados nos veículos, pois podem causar defeitos devido a instalações inadequadas, realizadas por mão de obra não especializada, ou sobrecargas nos circuitos se não dimensionados corretamente.

O efeito joule: nas instalações elétricas dos veículos pode elevar a temperatura do condutor elétrico, levando à autoignição do revestimento, e também pode resultar em curtos-circuitos pelo contato direto do condutor energizado com outros condutores ou com derivação à massa.

O revestimento dos condutores elétricos: pode sofrer ruptura mecânica devido a atrito ou flexão, e acionamentos de sistemas sem comando prévio indicam a ocorrência de curtos-circuitos no circuito elétrico.

Perigo Pós-Uso: Incêndios originados na parte elétrica dos veículos podem ocorrer horas após seu último uso. Isso ocorre porque alguns sistemas permanecem energizados mesmo com o veículo desligado e a chave removida da ignição.

Resumidamente, a análise do sistema elétrico deve considerar a integridade dos componentes, fenômenos termoelétricos, acessórios não originais, efeitos do efeito Joule, ruptura mecânica e possíveis riscos mesmo após o uso do veículo.

Foco inicial e agente ígneo

A definição da origem e do agente ígneo do incêndio em um veículo é uma etapa crucial na investigação. O perito deve determinar onde o incêndio teve início (foco inicial) e identificar qual foi a fonte do calor que desencadeou o fogo. Essas conclusões devem ser registradas por meio de fotografias para documentação adequada.

Causa e sub-causa

A definição da causa e sub-causa do incêndio em veículos segue um padrão semelhante ao adotado para edificações e pode ser categorizada da seguinte forma:

**Causa:**
1. Ação Humana.
2. Ação Humana Direta.
3. Ação Humana Indireta.
4. Acidental.
5. Natural.
6. Indeterminada.

**Sub-causas:**
a) Agentes físicos.
b) Agentes químicos.
c) Agentes biológicos.
d) Fenômeno termoelétrico.
e) Indeterminada.

Essas categorias são essenciais para a retroalimentação do ciclo de bombeiro, fornecendo informações valiosas que podem ser usadas no planejamento institucional e de outros órgãos, visando a redução ou minimização do índice de incêndios em veículos. A determinação precisa da causa e sub-causa é fundamental para a investigação adequada e a implementação de medidas preventivas eficazes.

Croqui do local

O Perito deve criar um croqui do local onde o veículo foi encontrado, destacando a posição do veículo e identificando o foco inicial do incêndio. O croqui deve incluir referências visuais, como postes, árvores ou vias de trânsito, acompanhado de informações de distanciamento entre esses pontos fixos e o veículo. Isso ajuda a documentar e contextualizar a cena do incêndio para fins de investigação.

Conclusão

Este croqui é uma ferramenta importante para a análise da cena do incêndio e pode fornecer insights valiosos sobre a origem e a propagação das chamas.

A metodologia proposta neste ensaio busca aprimorar a qualidade da perícia em incêndios veiculares, alcançando seus objetivos ao estabelecer uma sequência de procedimentos para investigações nesse contexto. Recomenda-se que os peritos utilizem uma lista de verificação detalhada, abrangendo informações como histórico de uso, manutenção, características técnicas do veículo e outros dados que possam ser relevantes para esclarecer o caso.

É importante ressaltar que essa sequência de procedimentos pode ser ajustada conforme a conveniência ou as particularidades de cada caso. Por exemplo, em situações envolvendo navios de cruzeiro, que compartilham semelhanças com edifícios residenciais temporários (hotéis), o perito deve adaptar sua abordagem.

A metodologia proposta é aplicável a uma ampla variedade de veículos, incluindo automóveis, caminhões, veículos ferroviários, embarcações e aeronaves. No entanto, é crucial que o perito também se aprofunde no conhecimento específico do tipo de veículo em questão, considerando seus sistemas particulares e elementos relevantes para a investigação.

Este ensaio serve como ponto de partida para o desenvolvimento de um protocolo pericial que pode ser refinado ao longo do tempo, com a adição ou remoção de etapas, conforme a experiência demonstre a necessidade de ajustes. A busca pela constante melhoria e aprimoramento é essencial para garantir a qualidade das perícias em incêndios veiculares.

Fontes

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